Os olhos dela são cor de mel.
Tem 23 anos.
É de Santa Catarina.
Uma menina negra,
magérrima, cabelos bem curtos, quase “de menino”.
Ela abandonou a casa aos treze anos.
Veio para Belém.
Mora nas ruas,
dorme em pedaços de papelão.
Nas noites de chuva, arranja um abrigo por dez reais.
Guarda carros nas transversais da classe média.
Briga “como homem” com os concorrentes.
Uma noite encontrei-a com um grande ferimento na testa.
Fruto de uma “divergência” pelo ponto.
A última vez que a vi, estava grávida.
Sentamos pra conversar e ela me disse que não ficaria com o filho.
Que a vida dela não servia pra ninguém.
Que o pai duvidava que o filho fosse dele.
Hoje me lembrei dela, no almoço.
Minha neta colocou comida em excesso no prato e não foi capaz de comê-la até o fim.
Uma pontada no estômago acompanhou a lembrança.
Uma agonia grande.
Um gosto amrgo na boca.