Apesar de ateu confesso meu pai comemorava a Páscoa como poucos cristãos.
O almoço era previamente organizado. Comida boa, farta e bonita. Os ovos de chocolate eram imprescindíveis. Na minha infância, o Natal era a Páscoa.
Curiosa com o que me parecia extremamente contraditório – a comemoração máxima dos católicos e sua descrença na igreja – perguntei a ele a razão daquela comemoração.
Contou-me o pai que, cuja infância paupérrima eu conhecia, que num domingo de Páscoa, quando tinha 6 ou 7 anos, amanheceram ele a avó com um único pedaço de pão amanhecido e nada mais. O avô já havia morrido – morreu com 21 anos meu avô – e eram apenas os dois. Dividiram o pão, sem ter como complementar a refeição. E desde esse dia ele jurou pra si que quando crescesse, casasse e tivesse filhos, a Páscoa seria sempre uma festa.
Eu segui a mesma trilha. O domingo de Páscoa é importante para mim. Não lembro, é verdade, do sentido da ressurreição, mas lembro sempre do pai. E penso quantas crianças passam o dia de hoje como ele o passou há quase cem anos.
E, apesar da alegria de fazer o almoço de Páscoa, de lembrá-lo sempre altivo e generoso, o chocolate deixa sempre um gosto doce amargo na boca.