Houve um tempo em que o dia da pátria me fazia sair de casa, principalmente quando os filhos eram pequenos. Na avenida principal da cidade eu os via desfilar e por mais que tentasse manter a frieza “revolucionária” e fizesse mil restrições à pátria de chinelos, eu chorava. Não era só pela emoção de ver os filhos desfilando, ingênuos e orgulhosos do seu Brasil-varonil, mas porque a banda marcial, os soldados perfilando-se em frente ao palanque, o povo vestido com roupas de festa, com seu melhor vestido ou camisa, as bandeirolas agitadas por mãos pequeninas, tudo parecia me integrar a um país que eu sonhava que seria “de todos”, como diz a propaganda do nosso atual comandante-em-chefe.
Quando acordei hoje me lembrei com prazer do feriado, da possibilidade de cuidar de coisas que estão sempre sendo postergadas porque o tempo ocupado pelo trabalho dificulta a atenção a tudo, mas demorei para lembrar o motivo da folga. Só agora caiu a ficha do 7 de setembro, da “independência ou morte”.
No caso do Brasil, este destino não se cumpriu. Não somos independentes, nem estamos mortos, embora os meninos- zumbis cheirando cola pelas ruas estejam muito perto disto.
No meu caso, também não. Ainda estou viva, e o vaticínio da “independência ou ...”, não se concretizou, ainda que a minha auto-suficiência neurótica – sugestão de diagnóstico recentíssimo que acatei sem muito esperneio – me faça crer que moro debaixo da minha cabeça. Mas, como não consigo me “independer” de um sentimento pesado e forte de que esta pátria, embora continue de chinelos, não me emociona mais, sou, na verdade, eterna refém das minhas esperanças perdidas.
E desta melancólica janelinha, mando um abraço pro Ademir Braz pelo seu aniversário, e reproduzo, de novo, um pedaço do poema de Vinícius de Moraes:
“Pátria minha”:
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A minha pátria é como se não fosse, é íntima
Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo
É minha pátria. Por isso, no exílio
Assistindo dormir meu filho
Choro de saudades de minha pátria.
Se me perguntarem o que é a minha pátria direi:
Não sei. De fato, não sei
Como, por que e quando a minha pátria
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
Em longas lágrimas amargas.
Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias pátria minha
Tão pobrinha!
(...)