Numa noite de quinta que parece de sábado, o trecho do poema de Vinícius vem à memória, trazido por um verso de Drummond.:
“(...) Trinta séculos lutou a humanidade pela semana inglesa
Descansasse o Senhor e simplesmente não existiríamos
Seríamos talvez pólos infinitamente pequenos de partículas cósmicas
em queda invisível na terra.
Não viveríamos da degola dos animais e da asfixia dos peixes
Não seríamos paridos em dor nem suaríamos o pão nosso de cada dia
Não sofreríamos males de amor nem desejaríamos a mulher do próximo
Não teríamos escola, serviço militar, casamento civil, imposto sobre a renda
e missa de sétimo dia.
Seria a indizível beleza e harmonia do plano verde das terras e das
águas em núpcias.
A paz e o poder maior das plantas e dos astros em colóquio
a pureza maior do instinto dos peixes, das aves e dos animais em cópula.
Ao revés, precisamos ser lógicos, freqüentemente dogmáticos.
Precisamos encarar o problema das colocações morais e estéticas,
ser sociais, cultivar hábitos, rir sem vontade e até praticar amor sem vontade
Tudo isso porque o Senhor cismou em não descansar no Sexto Dia e sim no Sétimo
E para não ficar com as vastas mãos abanando
Resolveu fazer o homem à sua imagem e semelhança
Possivelmente, isto é, muito provavelmente
Porque era sábado.”
Encarar os problemas das colocações morais e estéticas, sermos sociáveis, além de sociais, livrar-se de hábitos que nada mais são além disso, rir sem vontade e esconder a raiva, são tarefas que tomam também os domingos.
Agora, praticar amor sem vontade, poeta, a esta altura da vida, em dia nenhum!
Mas o poema de Drummond - O mundo é grande - que me trouxe a Vinícius e à sensação de uma noite de sábado é este:
O mundo é grande e cabe
nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
no breve espaço de beijar.
E o que tem uma coisa a ver com a outra, vou tentar entender de manhã.
Fui.