(...) "No comunicado ao povo cubano, Fidel diz que sua saúde "melhorou consideravelmente". Mas ressalva que "afirmar que o período de recuperação será curto e sem riscos seria absolutamente incorreto e peço a todos vocês para permanecerem otimistas, mas ficarem preparados para enfrentar notícias adversas". http://www.estado.com.br/editorias/2006/08/14/int-1.93.9.20060814.12.1.xml
Ao ler esta notícia, lembrei-me imediatamente da morte de Tancredo Neves. Da farsa montada em torno da sua morte, da indignidade da montagem de uma foto onde Tancredo, sustentado num sofá, refletia a morte nos olhos. E os falsos boletins médicos do Hospítal de Base de Brasília, sobre sua magnífica recuperação. E tudo isto era para garantir a transição pacífica da elite militar para a elite civil!
A foto de Fidel é real e nem mesmo o nosso jornalão conservador duvida disto. E a clareza da advertência dele sobre a concreta possibilidade da morte, faz toda a diferença.
Há um Brasil ficcional, com ilhas de satisfação e direitos garantidos em meio a um arquipélago de pobreza e desigualdades. E há uma Ilha onde a guerra sem tiros mais cruel do planeta - o bloqueio econômico imposto pelos EUA - não destruiu seu lider e seu povo.
Ando intolerante sim, e reconheço que parte desta intolerância é fruto das minhas frustrações e fantasias sobre um Brasil justo e decente. Mas não é só isto que explica esta certeza de que partido em bandas e entregue a bandos este país jamais será uma nação.
Não tenho mais equilíbrio para confrontar-me com a miséria e a pauperização de cada geração que nasce desfavorecida no país onde a concentração de renda é das mais indignas do mundo e achar que isso é um processo histórico e pronto.
Canso, às vezes, da minha persistência em andar e andar e dizer que há que organizar-se e exercer a cidadania como direito de nascimento, num país onde nascer é privilégio de quem "escapa" da morte se a mãe tiver acesso ao atendimento precário do pré-natal, ou se o recém-nascido sobreviver à desnutrição da primeira infância.
Não suporto ver jovens e adolescentes sem chance de disputar o futuro, pois para eles o futuro já nasceu ontem, morto, na pobreza dos avós e dos pais, na ignorância atávica nascida e mantida pela falta de escolas e de ensino de qualidade.
Talvez por isso, a música da minha cabeça hoje seja a Bandeira, do Zeca Baleiro:
"Eu não quero ver você cuspindo ódio
eu não quero ver você fumando ópio para sarar a dor.
Eu não quero ver você chorar veneno,
não quero beber o teu café pequeno,
eu não quero isso seja lá o que isso for.
Eu não quero aquele,
eu não quero aquilo.
Peixe na boca do crocodilo,
braço da Vênus de Milo acenando tchau...(...)"
Não sei, sinceramente, se consigo seguir a recomendação da música. Mas vou em frente, viajando hoje para retornar amanhã, depois de repetir, mais uma vez, que a vida pode ser melhor do que ela é.