Eu fumo muito e bebo pouco.
Não consigo ter a convicção da existência de Deus,
embora, às vezes, reze para o anjo da guarda para que proteja meus filhos
e quando faço isto reconheço em mim uma incongruência.
Mas, como tenho tantas, esta nem sequer me incomoda muito.
Convivo com muitas pessoas que parecem personagens saídas da minha imaginação
se acaso eu tivesse uma imaginação tão criativa!
Mas, reconheço que se convivo com elas, é porque as amo, do jeito que são,
embora perceba em mim, às vezes, muita vontade de que elas mudem.
Para melhor, segundo o meu desejo de que elas sejam
como eu gostaria que fossem!.
Faço análise e tomo antidepressivo.
Nem por isso me considero maluca, embora, às vezes,
me tema, por imaginar que a vida é trailer e que o filme ainda está por vir.
Amo apaixonadamente e odeio com alguma moderação,
embora, às vezes, tenha que conter a raiva com as mãos.
Tentei ser esquerdista e esforcei-me dedicadamente para cumprir meu objetivo.
O melhor que consegui foi ser reformista,
daqueles que acreditam poder mudar as estruturas por dentro,
embora, às vezes, olhando meu país em 2006,
tenha algumas recaídas e me pegue pensando
que a guerrilha poderia ter sido uma ótima alternativa!
Com certeza, alguns personagens que usaram a história para enfeitar seu perfil,
poderiam ter sido bons para roçar juquira nos canaviais!
Hoje me contento em assumir com tranqüilidade
que o que me mobilizou, na verdade,
não foi a minha força ideológica nunca cumprida,
mas a compaixão pelo sofrimento do outro
e que não me angustio mais em definir minha vocação.
Acredito, sim, na política e nos políticos decentes
e sou capaz de nomear alguns compromissados com o seu país.
Procuro perceber os indicativos de uma mudança na América Latina,
e os comemoro, mesmo que venham no rebojo das águas
o falso nacionalista ou o populista bem intencionado.
Mas, não me convidem a votar em ninguém esse ano.
Quero anular meu voto, como direito de cidadania.
Repito que amo a música e a minha neta Beatriz.
Ela tem seu nome ligado a uma linda canção
e a uma maravilhosa amiga.
Confesso meu cansaço, embora, às vezes, eu amanheça com o vigor da infância
e com a disposição de sonhar, como eu a tinha na juventude.
Mas hoje não. Hoje amanheci com a intensidade e o peso dos meus 56 anos.