Aprendemos desde sempre que o nosso país é formado pela miscigenação das raças. Louvamos a herança negra a feijoada, o batuque, a afro-religiosidade dos terreiros. Somos condescendentes com tudo aquilo da herança negra que circunscreve o exotismo ou o folclore. Esquecemos, porém, de contar nos nossos livros de história que o Brasil foi o último país a abolir a escravidão, que 40.000 negros morreram apenas nos navios negreiros, que a nossa escravidão durou oficialmente 352 dos nossos 505 anos de existência.
Esquecemos também de informar que a mão de obra negra foi indispensável na construção da riqueza do Brasil colonial, do Brasil republicano, do Brasil industrial e deste Brasil chinfrin pós-neo liberal, onde cada vez mais o salário médio do homem e da mulher negra está muito abaixo da média salarial do homem e da mulher branca.
Confundimos, os homens e mulheres de boa vontade, a questão racial com a questão econômica, e acabamos referendando, com nossas boas intenções, o mito do Brasil desigual pela renda, mas não-racista.
Assim, contribuímos para que o racismo à brasileira nascesse e fosse cevado com a marca da cordialidade. E nos descobrimos muito mais cruéis do que os grandes irmãos do norte, pois que aqueles, quando aboliram a escravidão, garantiram a cada negro 40 acres de terra e uma mula (não por acaso, o nome da produtora de Spike Lee) e os nossos escravos libertos em 1888, receberam a miséria como doação, impedidos que estavam de serem considerados cidadãos, pela Lei de Terras, aprovada 33 anos antes da libertação.
O racismo à brasileira é assim: cruel, disfarçado, hipócrita e cordial, alimentado pela teoria da miscigenação. Que é real, concretíssima, num país onde 42% dos brasileiros são pretos ou pardos. Mas, afinal, não somos todos tão irmãos assim....